Reflexões sobre o futuro do Brasil: uma visão do escritório de assuntos externos da comunidade bahá’í

A ocasião do bicentenário da independência do Brasil, em 7 de setembro de 2022, oferece um convite para refletirmos sobre os desafios que se apresentam à nossa sociedade e sobre os caminhos que temos adiante.

Para os bahá’ís, a humanidade está vivendo um estágio de grande importância em sua história, que se vê refletido em nosso contexto nacional. Vivemos um período que pode ser comparado à adolescência da vida humana, uma transição instável e turbulenta e simultaneamente promissora. Práticas e concepções que historicamente foram amplamente aceitas, assim como hábitos que eram apreciados estão se tornando rapidamente obsoletos. Ao mesmo tempo, novos poderes e capacidades que estavam latentes se tornam evidentes à medida que os imperativos da maturidade se impõem. Avançamos neste caminho conforme as diferentes facetas da vida social operem com base na cooperação e na assistência mútua, refletindo o princípio da unicidade do gênero humano.

Nesse período de mudanças, acreditamos que um país com as potencialidades do Brasil precisa considerar o seu futuro a partir de dois imperativos: trazer prosperidade para toda a população brasileira e contribuir de forma destacada para o desenvolvimento de uma emergente civilização global. A busca por esses dois objetivos inter-relacionados requer uma concepção renovada de desenvolvimento e um exame aprofundado de ideias fundamentais.

A sociedade que construímos deve refletir a visão sobre quem nós somos. Longe de constituir um amontoado de necessidades e ausências, um mercado consumidor ou simplesmente uma força de trabalho numerosa, a população brasileira possui o potencial para se tornar protagonista de seu processo de desenvolvimento. Um olhar atento às crianças, jovens e adultos do país revela inúmeras qualidades distintivas, tanto intelectuais como espirituais. “Corações expansivos, uma paixão pelo progresso, energia ilimitada, grande resiliência, uma força forjada a partir da diversidade e mentes iluminadas pelo espírito da época e inspiradas pela busca da justiça” estão presentes abundantemente em periferias urbanas e grandes cidades, em aldeias indígenas e nas áreas rurais. O maior recurso para o avanço do Brasil é o nosso povo, cujas potencialidades podem ser amplamente desenvolvidas.

Acreditamos que o desenvolvimento do país deve ter como foco principal a construção das capacidades das pessoas, das comunidades e das instituições da sociedade em todo o território nacional. Historicamente a relação entre esses atores do desenvolvimento tem sido marcada pela disputa e pelo conflito. No entanto, é pelo fortalecimento das inter-relações dinâmicas de uns com os outros que seus poderes são combinados e potencializados. As instituições precisam se tornar cada vez mais canais através dos quais os talentos e as energias dos membros da sociedade possam ser expressados em benefício da humanidade. Os indivíduos devem contar com as oportunidades para desenvolver suas capacidades e colocá-las a serviço da coletividade. E as comunidades precisam criar o ambiente que leve ao enriquecimento da cultura. Juntos, esses atores podem aprender a contribuir para a prosperidade de toda a população e oferecer a nossa contribuição para o conjunto das nações.

O compromisso com um processo de desenvolvimento de capacidades exige que coloquemos o conhecimento no centro da nossa sociedade. Até o momento, essa centralidade tem sido ocupada pela atividade econômica, o que tem permitido o fortalecimento da busca pelo interesse próprio e da indiferença com o sofrimento alheio e tem contribuído para a instabilidade social e a desatenção com o meio-ambiente. A atividade econômica possui um papel indispensável na criação de riqueza e na sua distribuição equitativa. No entanto, ela só poderá alcançar seu propósito mais elevado se deixar de ser considerada um fim em si mesma e passar a servir como meio para alcançar propósitos mais elevados. Conferir centralidade ao conhecimento no desenvolvimento do país implica criar uma dinâmica de aprendizagem que traga à tona a participação de toda a população.

Nessa direção, é fundamental que a sociedade possa se beneficiar dos métodos da ciência e ser guiada por princípios espirituais. A ciência permite às pessoas tornarem-se mais objetivas e sistemáticas em seus enfoques para a solução de problemas e em seu entendimento dos processos sociais, enquanto que a confiança nas inclinações espirituais dos indivíduos provê o ímpeto motivacional que alimenta e dá continuidade à ação positiva. Uma transformação significativa das condições da sociedade não envolve simplesmente a aquisição de habilidades técnicas, mas, mais importante ainda, o desenvolvimento das qualidades e atitudes que estimulam os padrões criativos e cooperativos de interação humana.

Precisamos aprender a combinar de forma inteligente o conhecimento gerado pela ciência e as percepções advindas da herança espiritual da humanidade, bem como os saberes tradicionais e conhecimentos populares. Nesse contexto, toda estrutura da sociedade – a fazenda, a fábrica, a escola e etc – pode servir como um centro dinâmico de aprendizado.

Acreditamos sinceramente que à medida que um número crescente de pessoas se reúna em pensamento e ação ao redor de um empreendimento tal qual o que descrevemos, mesmo os maiores desafios que teremos como país poderão ser devidamente superados e a paz e a prosperidade de toda a população serão asseguradas.

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